segunda-feira, 31 de julho de 2017

Sete maneiras de se deleitar em Deus que nos beneficiam.


Por Josemar Bessa


Em “A Christian Directory”, página 140, Richard Baxter (1615-1691) lista sete benefícios de olhar pela fé para o Senhor, como a nada mais, como nosso prazer mais profundo:


1. Se deleitar e se deliciar em Deus é a única coisa que provará que o conhecemos e o amamos e que estamos preparados para o seu reino, pois todos e só os que se deleitam nEle agora, o apreciarão por toda eternidade.


2. A prosperidade, isto é, a pequena adição de coisas terrenas, não nos corromperá, afastará ou afetará se realmente nos deleitamos e deliciamos em Deus somente.


3. A adversidade, isto é, a retenção de delícias terrenas, não nos afligirá demais ou expulsará o consolo todo suficiente e onipotente em nossas aflições por mais terríveis que sejam, se nos deleitamos em Deus realmente.


4. Receberemos grandes lucros de um sermão ou livro ou conversa se nos deleitamos em Deus realmente, mas os que não se deleitam nele assim, as muitas oportunidades, sermões, livros... se mostrarão inúteis no fim.


5. Todo o nosso serviço será doce para nós e aceitável para Deus; Se nos deleitarmos somente nEle, Ele certamente se deleita em nós por Jesus Cristo.


6. Teremos uma festa contínua dentro de nós – nas profundezas da alma, para adoçar todas as cruzes, aflições e angústias de nossas vidas e para nos proporcionar alegria maior que a maior tristeza que este mundo triste e caído possa produzir se nosso deleite realmente está somente em Deus.


7. Quando nos deleitamos em Deus realmente, nossos prazeres na criação serão santificados para nós e justificados, estando sempre em seu devido lugar, já nos que não se deleitam e deliciam em Seus esses prazeres se tornam idólatras e corruptos.


Não há nada em Deus que precisamos filtrar, achar insuficiente ou nos preocupar de falhar. Ele é a nossa verdadeira e completa felicidade na mais profunda escuridão.   ( Richard Baxter | 1615-1691 )



Fonte: http://www.josemarbessa.com/2017/07/sete-maneiras-de-se-deleitar-em-deus.html

domingo, 23 de julho de 2017

Em que solo frutificaram os Cinco Solas?

Por Davi Lago


Em que solo frutificaram os Cinco Solas?



Lembremos que a palavra de Cristo cai sempre em quatro solos e que não foi diferente meio milênio atrás: muitos não a entendiam (sementes à beira do caminho), outros ouviam, mas temiam as retaliações (solos rochosos), outro grupo estava acomodado com as regalias do poder e a fascinação das riquezas (solo espinhoso). Rememoremos então que a semente caiu em solo bom, corações atentos como o de Martinho Lutero, e logo vieram frutos espirituais, frutos que permaneceram. A boa nova no bom solo é como Jesus disse: “são aqueles que ouvem a palavra e a recebem, frutificando a trinta a sessenta e a cem por um” (Mt 13.23).

Arraigados e alicerçados no evangelho, os reformadores enfrentaram a corrupção da igreja no estágio final da era medieval. A instituição estava em estado público de putrefação com a perversão moral do clero, exploração financeira sistemática da fé das pessoas com venda de indulgências e outras blasfêmias ante as genuínas exigências do discipulado cristão. As convicções dos reformadores (desde o chamado de retorno às Escrituras proposto por John Wycliffe e Jan Hus, passando pelas 95 teses e pela disputa de Lutero com Erasmo acerca da salvação pela graça, os 67 artigos de Ulrich Zwingli que defenderam a supremacia de Cristo como cabeça da igreja, os escritos de Calvino, e tantos outros documentos) foram sintetizadas em tempos mais recentes como Cinco Solas. Cinco frases em latim que sumarizam tanto o arcabouço teológico propositivo dos reformadores, como suas linhas de combate aos desmandos do poder eclesiástico de então.

É sempre bom revisitar o sistema solar reformado, cinco pilares de um castelo forte onde a pedra angular é Cristo: Sola scriptura, somente a Escritura, pois ela é a semente que devemos lançar. Nossas especulações e tradições não estão acima das letras sagradas. Não podemos esquecer que os reformadores traduziram as Escrituras para uma língua compreensível ao povo. Antes a Bíblia era lida em latim e somente a instituição era “autorizada” a interpretá-la. A Reforma demoliu a noção de uma corporação religiosa capaz de salvar ou mediar o acesso à salvação. “Pela graça sois salvos” (Ef 2.8), então sola fide, sola gratia, a salvação é pela graça por intermédio da fé. Não somos salvos por nossas obras, mas pela obra de Jesus consumada na cruz. Portanto, solus Christus, somente Cristo! Jesus ressuscitou! Ele é o tesouro absoluto, o centro do culto, da pregação, o autor e consumador da nossa fé, Salvador de cada esfera de nossa vida. “Meu Pai é glorificado pelo fato de vocês darem muito fruto”, disse Jesus. Soli Deo gloria, somente a Deus seja toda a glória.

Em que solo cairão hoje os Cinco Solas? Em que solo estão caindo as sementes do evangelho? É óbvio perceber quinhentos anos depois que a Reforma desencadeou mudanças estruturais que redesenharam a civilização ocidental e influíram de modo decisivo na formação do mundo contemporâneo. Não por acaso, o filósofo brasileiro Fabio Konder Comparato chama a Reforma de “primeira revolução moderna” em sua Ética. Mas não podemos esquecer que a origem de tudo isso foi a semente da palavra de Cristo encontrando bons solos. Vamos trazer à memória aquilo que nos traz esperança, vamos prosseguir para o alvo em Cristo Jesus. “Tão-somente vivamos de acordo com o que já alcançamos” (Fp 3.16). Tão-somente sejamos bons solos.



• Davi Lago, pastor batista, mestre em Filosofia do Direito (PUC/MG).

Foto ilustrativa: Designed by Freepik


Fonte: http://www.ultimato.com.br/conteudo/cinco-solas-e-quatro-solos

sexta-feira, 14 de julho de 2017

Se Deus é o autor da Escritura, então a Escritura é verdadeira



Por Stephen J. Nichols


Se você leu história da igreja, você já viu tudo. Isso não é inteiramente uma hipérbole. Muitas das objeções e perguntas com as quais lidamos na igreja hoje foram enfrentadas por gerações passadas de crentes. Um homem sábio já não disse: “Nada há novo debaixo do sol”? Isso é verdadeiro sobre a doutrina da inerrância. Em 1979, Jack B. Rogers e Donald McKim escreveram um livro intitulado The Authority and Interpretation of the Bible: An Historical Approach [A Autoridade e Interpretação da Bíblia: Uma Abordagem Histórica]. A ideia ou tese central ficou conhecida como a proposta Rogers/McKim, que é esta: A Bíblia é autoritativa em questões de fé e conduta, mas não é infalível quando se trata de detalhes históricos ou científicos. Além disso, a doutrina da inerrância é uma inovação do século XIX. Rogers e McKim argumentaram que os teólogos de Princeton do século XIX e início do século XX, mais notavelmente B.B. Warfield, criaram a doutrina da inerrância, que ensina que a Bíblia é inteiramente sem erro em tudo o que afirma.

A proposta de Rogers/McKim foi uma reação à Declaração de Chicago sobre a Inerrância Bíblica, de 1978. Essa declaração foi a obra do Conselho Internacional sobre a Inerrância Bíblica (CIIB), liderada por pessoas como R.C. Sproul, Edmund Clowney, J.I. Packer, James Montgomery Boice, e outros. O conselho produziu uma declaração de cinco parágrafos breves, uma lista de dezenove artigos de afirmação e negação, bem como três páginas de exposição adicional.

A Declaração de Chicago
A Declaração de Chicago foi elaborada durante quatro dias no fim de outubro de 1978 no hotel Hyatt Regency no Aeroporto O’Hare de Chicago. Os líderes do CIIB assinaram primeiro, depois outros em Chicago; em um total de 268 assinaturas. Nas semanas e meses seguintes, centenas de assinaturas foram adicionadas de todo o país e do mundo por representantes de várias denominações, ministérios, universidades e seminários. Ao longo da década seguinte, o CIIB publicou livros e folhetos, patrocinou conferências e reuniões e promoveu a doutrina da inerrância na igreja e no meio acadêmico.

Se você indagasse os participantes mais eminentes a respeito da inerrância em Chicago, descobriria que eles realmente haviam sido influenciados por B. B. Warfield e outros oriundos de Princeton. Afinal, foi Warfield quem ajudou a igreja ao oferecer um argumento direto e simplificado para a inerrância.

O filósofo medieval William de Ockham é conhecido por seu princípio da parcimônia, ou simplicidade. O argumento com o menor número de suposições é o melhor argumento, afirma o princípio. O argumento que não se baseia em uma complexa rede de argumentos e sub-argumentos é o melhor argumento. Warfield usou bem a navalha de Ockham. O argumento simples, mas não simplista, que ele fez foi este: Se Deus é o autor da Escritura, então a Escritura é verdadeira.

Nós poderíamos usar os termos teológicos da inspiração e inerrância aqui. Se a Bíblia é a Palavra de Deus, se é o texto inspirado que foi soprado por Deus, então evidentemente ela é verdadeira. Se a Bíblia é inspirada, ela é inerrante. Este argumento simples, mas preciso, é o dom de Warfield para a igreja.

A Declaração de Chicago amplia esse argumento básico e, muito importante, estabelece os limites do que significa e o que não significa inerrância por meio dos seus dezenove artigos de afirmação e negação. A Declaração de Chicago sustentou uma geração inteira na batalha pela Bíblia. Ela deu vigor aos conservadores teológicos na Convenção Batista do Sul quando eles entraram em combate em seus seminários, agências e estruturas denominacionais, aos conservadores teológicos no Presbiterianismo e em outras tradições, e a muitos outros líderes evangélicos.

Atualmente, estamos vendo a antiga proposta de Rogers/McKim novamente. A acusação está sendo feita de novo de que a inerrância é uma invenção moderna e de que os evangélicos têm à sua disposição outros modelos para entender a autoridade da Escritura. “A inerrância não é necessária”, tem sido dito a nós. “Podemos pensar sobre a Escritura de uma maneira diferente”. Mas essas novas contestações são realmente novas?

Pedro realmente o disse?
Um olhar intrigante para a doutrina da igreja primitiva sobre a Escritura vem de uma correspondência entre Jerônimo e Agostinho. Enquanto Jerônimo estava trabalhando em sua tradução da Bíblia, ele se deparou com Gálatas 2.11-14 e o confronto de Paulo com Pedro em Antioquia. Em uma tentativa de proteger a reputação de Pedro, Jerônimo concluiu que todo o episódio era fictício.

Agostinho cria que se você admitir o erro em um lugar, a Bíblia inteira estará aberta à dúvida. Ele escreveu a Jerônimo uma série de cartas por essa causa. Em uma carta, Agostinho escreveu:

Admita mesmo uma única mentira bem-intencionada em uma autoridade tão exaltada, e não haverá uma única seção daqueles livros que escapará, se parecer a alguém apresentar dificuldades do ponto de vista prático ou for difícil de crer do ponto de vista doutrinário, pelo mesmo princípio muito prejudicial de ser classificada como o ato deliberado de um autor que estava mentindo.

Agostinho afirmava “a autoridade da verdade não adulterada”. Ele acrescentou:

Deve ser feito um esforço para levar ao conhecimento das Sagradas Escrituras um homem que tenha uma opinião tão reverente e confiável sobre os livros sagrados que se recusaria a encontrar prazer em uma mentira bem-intencionada em qualquer passagem deles e que ignoraria o que não entende ao invés de preferir a sua própria inteligência à veracidade deles.

Quando alguém prefere a sua própria inteligência, Agostinho continuou: “tal pessoa exige credibilidade para si mesmo e tenta destruir a nossa confiança na autoridade da Sagrada Escritura”. Nós nos submeteremos à Escritura, ou submeteremos a Escritura a nós mesmos?

Essa correspondência entre Agostinho e Jerônimo nos ensina muitas coisas. Ensina-nos que Warfield não inventou a doutrina da inerrância. Warfield contribuiu para o desenvolvimento da nossa compreensão sobre a inerrância bíblica, oferecendo uma maneira útil de declarar a doutrina. Mas ele não a inventou.

Essa correspondência também nos ensina que as contestações à “autoridade não adulterada” e à plena veracidade das Escrituras não são novas. Na verdade, essas objeções são bem mais antigas do que 390 d.C. As contestações remontam ao jardim e a Gênesis 3.1. Além disso, essa correspondência revela a verdadeira questão subjacente a essas objeções à inerrância. A verdadeira questão é a falta de submissão.

Agostinho compreendeu que devemos submissão à Palavra de Deus porque devemos submissão a Deus. João Calvino ressalta exatamente esse ponto em seu comentário sobre 2 Timóteo 3.16, onde escreve: “Devemos à Escritura a mesma reverência que devemos a Deus, porque ela procede somente dele”. Em suas Institutas da Religião Cristã, Calvino acrescenta: “A plena autoridade que [as Escrituras] têm para os fiéis não procede de outra consideração senão de que eles são convencidos de que elas procedem do céu, como se Deus fosse ouvido falando a eles”.

Martinho Lutero chamou a Bíblia de nosso fundamento. Ele advertiu: “Não devemos nos desviar das palavras… De outro modo, o que aconteceria com a Bíblia?”. Lutero disse uma vez que, quando se trata da Bíblia, ou tudo o que ela ensina é crido ou nada do que ela ensina é crido.

A declaração de Lutero aqui exige consideração. Que opção temos no lugar da doutrina da completa inerrância e absoluta veracidade da Bíblia? Inerrância limitada? Por que não chamar simplesmente de errância limitada? Agostinho, Calvino e Lutero, assim como muitos outros, todos alertaram sobre o perigo de uma visão da veracidade bíblica que seja menos do que a completa inerrância. Essa tem sido a posição cristã ortodoxa ao longo dos séculos.

Um livro antigo para hoje?
À medida que a igreja enfrentava o começo do século XX, o modernismo estava a todo vapor. Suas realizações foram grandes, incluindo progressos monumentais nas ciências e tecnologia. Todos esses avanços suscitaram uma questão de importância singular: um livro antigo ainda é uma autoridade segura e confiável para hoje?

Warfield respondeu a essa pergunta com um ressonante sim para sua geração. À medida que as denominações e os seminários, um por um, se empenhavam em questionar a autoridade bíblica na década de 1970, o grupo de pastores e teólogos de Chicago respondeu com seu próprio e retumbante sim à autoridade não adulterada das Escrituras para sua geração. Aqueles labores de Warfield e dos idealizadores e signatários da Declaração de Chicago sustentaram um século de pastores e ministros do evangelho. A obra deles fortaleceu a igreja.

Embora vivamos em uma nova geração, ela está tristemente perturbada pelo mesmo antigo problema de insubmissão à Palavra de Deus. Mais tristemente, tal falta de submissão também pode estar presente na igreja. Portanto, devemos ler nossa história da igreja e aprender a reagir. Ao lermos as páginas da história da igreja, veremos primeiro a reverência que nossos antecessores tinham pela Bíblia e sua visão da sua completa veracidade e autoridade não adulterada. Nós também seremos levados de volta às páginas da própria Bíblia, de volta à Palavra de Deus, a Palavra da verdade para todas as épocas.


Dr. Stephen J. Nichols: é professor na Lancaster Bible College and Graduate School, e conquistou seu Ph.D. no Westminster Theological Seminary. Ele é membro da Evangelical Theological Society e, dentro da sociedade, é presidente do Grupo de Estudo Jonathan Edwards.


Fonte: http://voltemosaoevangelho.com/blog/2017/07/se-deus-e-o-autor-da-escritura-entao-escritura-e-verdadeira/

quarta-feira, 5 de julho de 2017

Por que preferimos Ismael ao invés de Isaque?

Por João Leonel


Gn 17.18-19

Abrão estava com oitenta e cinco anos. Com setenta e cinco Deus apareceu a ele pela primeira vez (Gn 12.4) e lhe fez a promessa de que dele surgiria uma grande nação (12.2).
Passaram-se dez anos e Abrão permanecia sozinho com Sarai. Nada da descendência prometida. O casal já era idoso e a possibilidade de ter filhos diminuía com o passar do tempo.

Então, Sarai chama o esposo e tem uma conversa séria com ele. Diz que é fato que eles não conseguiam gerar filhos. Então, era necessário fazer algo. O modo mais prático de terem descendência, de verem a promessa de Deus ser cumprida era Abrão tomar a escrava Hagar e ter filhos com ela. O esposo concorda. No ano seguinte nasce Ismael (16.15).

Passados treze anos, Deus aparece novamente a Abrão (17.1). Agora ele tem noventa e nove anos. Deus faz uma aliança com o patriarca, constando dela a renovação da promessa de que dele surgiria uma grande nação (17.2-3). E há uma especificação: o filho que ele e Sara gerariam deveria ser chamado de Isaque (17.19). O filho da promessa, passados vinte e quatro anos desde a primeira aparição a Abrão, tem nome – Isaque.

Abraão reage. Diz a Deus: “Tomara que viva Ismael diante de ti” (17.18). Frente à promessa de Isaque, Abraão, incrédulo, prefere se apegar àquilo que já existia – Ismael. Afinal, quem garantiria que depois de vinte e quatro anos Deus finalmente cumpriria sua promessa?

Deus promete Isaque. Abraão prefere confiar em Ismael.

A situação tensa enfrentada por Abraão e Sara espelha nossas lutas em vivermos pela fé.

Geralmente pensamos que Abraão, depois de algumas vicissitudes em sua relação com Deus, rapidamente gera Isaque e se torna o patriarca, o homem de fé que é exaltado no Novo Testamento. Mas não foi bem assim. Como nós, ele titubeou, fraquejou, procurou as soluções visíveis em lugar de confiar nas promessas invisíveis.

Deus prometeu que dele surgiria uma nação quando ele tinha setenta e cinco anos. Passaram-se vinte e quatro anos para que isso começasse a se cumprir com a gravidez de Sara. Vinte e quatro anos!

Quanto tempo leva para eu e você duvidarmos das promessas de Deus? Um mês? Seis meses? Um ano? Abraão esperou duas décadas e meia para ver o rosto do filho prometido!
Por vezes constatamos em nossa vida a falta de fé do pai da fé: Deus promete Isaque; Abraão se apega a Ismael.

Afinal, Ismael é uma realidade. Ele existe. Abraão o viu nascer, identificou-se com ele. Tem carinho pelo filho gerado por Hagar. Isaque... bem, Isaque permanece envolto nas brumas da promessa divina que tarde para chegar. E como demora!

Deus diz: Isaque. Nós dizemos: prefiro aquilo que vejo, que sinto, que posso tocar. Prefiro Ismael.

E assim ficamos com meias promessas, meias verdades, meias bênçãos.
Vivemos tempos em que Deus diz: Isaque. E nós dizemos: Ismael.


Imagem: By Caravaggio - scan, Public Domain.

• João Leonel é pastor presbiteriano, mestre em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo e doutor em Teoria e História Literária pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).


Fonte: http://www.ultimato.com.br/conteudo/por-que-preferimos-ismael-ao-inves-de-isaque

quinta-feira, 15 de junho de 2017

A Inquisição Espanhola e a Reforma Protestante



Por Stephen Nichols


Em 1492, Fernando e Isabel da Espanha patrocinaram Cristóvão Colombo e sua viagem ao Novo Mundo. Mas em 1477, eles estiveram por trás de algo muito mais infame. Naquele ano, os monarcas espanhóis pediram ao Papa Sisto IV que reestabelecesse a Inquisição, visando muçulmanos e judeus. Assim começou o reinado de terror conhecido como a Inquisição Espanhola.

A Inquisição Espanhola ocorreu na maior empreitada das cortes eclesiais e seculares que impunham conformidade com a Igreja Católica Romana e eliminação de toda a dissidência. Roma patrocinou inquisições já no século onze. Mas a Inquisição Espanhola foi única. Primeiro, ela era controlada pela monarquia, e não pelo papado, e seria ainda mais motivada politicamente do que outras inquisições.

A Inquisição Espanhola também foi única em relação ao seu cenário na Espanha. Durante séculos, os muçulmanos governaram a Península Ibérica; não foi até 1250 que os católicos reconquistaram a área. E mesmo depois, muitos muçulmanos permaneceram, e grandes populações judaicas também se espalharam pela Espanha. A perseguição popular irrompeu contra esses judeus e muçulmanos espanhóis, forçando-os a se converterem ao catolicismo e serem batizados ou mortos. Milhares foram convertidos sob coação e eram conhecidos como conversos. Posteriormente, a Inquisição procurou os conversos, buscando determinar se suas conversões eram genuínas ou se continuavam a praticar a sua antiga fé, um crime punível com a morte. Os judeus e muçulmanos com princípios fugiam ou enfrentavam a selvageria da Inquisição.

Isso leva à terceira característica que marca a singularidade da Inquisição Espanhola: ela se elevou a níveis terríveis de perseguição. É bem conhecida por seu uso da tortura para extrair confissões e para o auto-da-fé (ato de fé), um ato ritualizado de penitência pública que acabava com a execução do acusado. A violência continuaria até o próximo século e depois, mas chegaria ao seu apogeu durante a Reforma.

Depois de 1516, a Inquisição Espanhola tinha um novo alvo: aqueles que protestavam contra a Igreja Católica Romana. À medida que as ideias de Lutero ganhavam apoio em terras católicas, a Inquisição ganhou poder. A Inquisição espanhola seguiu um princípio singular e direcionado: o erro deve ser eliminado. É claro, definiu o erro como qualquer oposição à Igreja Católica Romana. Para derrotar qualquer erro, a Inquisição não parou em nenhuma delimitação. Além disso, nenhuma pessoa estava fora dos limites. Sacerdotes, freiras, bispos e até mesmo autoridades seculares tiveram que se submeter às suas decisões.

Então, durante a década de 1540, Roma tentou voltar-se contra a Reforma. A primeira medida foi a formação dos jesuítas por Inácio de Loyola, em 1540. A segunda medida foi o Concílio de Trento, convocado pela primeira vez em 1545 e reunido de forma intermitente até 1563. Seus decretos consagraram a postura anti-Reforma de Roma. A terceira e, de longe, a mais cruel dessas medidas foi que a Inquisição aumentou em sua intensidade, em 1542. Naquele ano, o papa Paulo III emitiu a bula papal Licet ab initio (Permitida desde o início), que concedeu autoridade absoluta a seis cardeais para estenderem a Inquisição.

Um desses cardeais tornou-se o papa Paulo IV; ele publicou o temido primeiro Índice de Livros Proibidos, em 1559. A lista de livros banidos incluía as obras dos Reformadores, bem como Bíblias em línguas vernáculas. Aqueles pegos com uma cópia da Bíblia em alemão, inglês ou francês seriam levados perante a Inquisição, presos e julgados. Ao serem considerados culpados, seriam torturados, martirizados, ou ambos.

Os inquisidores perseguiram os protestantes na Itália e em partes da Alemanha. Conforme os huguenotes cresciam na França, eles também ficaram sob a autoridade da Inquisição. Nicholas Burton, um comerciante, foi uma das vítimas da Inquisição. Os carcereiros de Burton o levaram para o confinamento solitário porque ele falou com muita ousadia e persuasão sobre o evangelho. Antes de queimá-lo na fogueira, oficiais da Inquisição removeram a sua língua para silenciar o seu testemunho diante da multidão reunida em seu martírio. Os registros da Inquisição transbordam de relatos daqueles que “disseram e fizeram coisas típicas do herege Lutero”. Em 1635, um homem foi levado à Inquisição porque comeu bacon e cebola no dia de São Bartolomeu. Como uma ironia da história, em 1527 a Inquisição encarcerou até mesmo Inácio de Loyola, o fundador dos jesuítas. Os inquisidores entenderam completamente mal algumas declarações que ele tinha feito. A Inquisição ocorria por suspeita e até mesmo por pura ignorância. Muitas vezes, a Inquisição exagerou a sua mão, e acabou por se tornar seu próprio pior inimigo. À medida que as autoridades seculares cresceram em poder no século XVI, lentamente desmantelaram o poder da Inquisição, até que foi finalmente abolida em 1834.

A Inquisição não desistiu das suas tentativas de apagar a chama inflamada pela Reforma, mas, por fim, falhou em sua missão de eliminar o “erro”. Embora a Reforma tenha deixado um legado notável, a Inquisição Espanhola também se tornou marcante. Sobre o papa Paulo III, Lutero disse: “Deixe os Papistas fazerem discussões e considerarem as suas traições. Cristo vive”.


Por: Stephen Nichols. © Ligonier Ministries. Website: ligonier.org . Traduzido com permissão. Fonte: The Spanish Inquisition

Original: A Inquisição Espanhola e a Reforma Protestante. © Ministério Fiel. Website: MinisterioFiel.com.br. Todos os direitos reservados. Tradução: Camila Rebeca Teixeira. Revisão: André Aloísio Oliveira da Silva.


Fonte: http://voltemosaoevangelho.com/blog/2017/06/inquisicao-espanhola-e-reforma-protestante/

quarta-feira, 31 de maio de 2017

O que os pais de família da Bíblia nos ensinam?

Por Billy Lane


Gosto de olhar para o livro de Gênesis na perspectiva da história de pais de família e sua relação com Deus, com o trabalho, com a sociedade e com a herança ou promessa de Deus. Não temos nenhum herói. Todos são essencialmente humanos em suas fraquezas e erros. Suas famílias estão longe de serem idealizadas como exemplo a ser seguido. Justamente por isso eles têm algo importante para nos ensinar.

O primeiro chefe de família, naturalmente, é Adão. Eu o considero aquele filhinho do papai que colocou tudo a perder. Adão herdou um paraíso. Foi criado nas melhores condições possíveis. Tinha tudo para dar certo. Foi colocado num jardim prazeroso, tinha trabalho, esposa, descanso e responsabilidades. Mas uma coisa ele não tinha. Não tinha autonomia moral. Ele não podia decidir por si mesmo o que era certo e errado. Isso se representa na proibição de tomar do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, isto é, da autonomia sobre o bem e o mal. E isso ele devia contas a Deus. Mas lhe cabia entender os limites de sua autonomia e se sujeitar ao seu criador. Adão, porém, preferiu se tornar como Deus, “conhecedor do bem e do mal” (Gn 3.5, 22). Para Adão não bastava ter tudo, ele queria ser dono de seu próprio destino, ser igual a Deus. Tomou do fruto e perdeu a vida. Colocou tudo a perder.

O segundo pai de família é Noé. Ao contrário de Adão, ele não herdou uma bela propriedade nem vivia num ambiente prazeroso. Pelo contrário, vivia numa sociedade corrupta, mas nem por isso se deixou levar pela corrupção e degradação moral. Ele era justo e íntegro na sua geração. É apresentado também como aquele que “nos aliviará do nosso trabalho e do sofrimento de nossas mãos, causados pela terra que o Senhor amaldiçoou” (Gn 5.29). Essa é uma alusão direta à maldição de Gênesis 3.17, em que Deus amaldiçoa a terra e causa ao homem sofrimento em decorrência do pecado. Em Gênesis 6.6, há três verbos usados que, certamente, pretendem fazer alusão a Gênesis 5.29: “Então o Senhor arrependeu-se de ter feito o homem sobre a terra, e isso cortou-lhe o coração”. A raiz dos verbos arrependeu-se, ter feito e cortou-lhe são, respectivamente, as mesmas de aliviará, trabalho e sofrimento de Gênesis 5.29.¹ Além de ser íntegro, Noé traz alívio ao sofrimento, é um refrigério para a sua geração.

O terceiro é Abraão, um cidadão comum, itinerante, com promessa de um grande futuro, que se tornou pai de grandes nações. Além de não ter terra nem descendência, nada se diz que Abraão se destacasse por sua integridade ou por qualquer virtude especial em relação à sua geração. Sabemos sim que tinha posses e empregados (Gn 12.5). Mas foi chamado por Deus para ser abençoado e abençoador de todas as famílias da terra. Cometeu muitos erros. Muitas vezes quis dar um jeitinho para adiantar as coisas para Deus, mas apesar das falhas, perseverou em seguir a instrução de Deus. Teve de pedir para os filhos de Hete um lugar para enterrar sua esposa. Não viu seus descendentes ocuparem definitivamente a terra prometida. Mas viveu confiante na promessa de Deus.

Jacó, naturalmente, é outra figura de destaque na história de Gênesis. Ele é mais polêmico. É um desastrado usurpador do direito do outro e que, a despeito de seus erros, se torna também o patriarca de uma nação. A vida de Jacó é marcada por querer se apropriar da bênção de Deus com a própria força. Manipula as coisas para sua vantagem. Quer se sair melhor sempre. Começa no nascimento segurando no calcanhar do irmão, o que lhe rendeu o nome Jacó (i.e., aquele que segura no calcanhar, suplantador). Depois rouba o direito e bênção de primogênito de seu irmão. Mais tarde tenta enrolar seu sogro e é enrolado por ele. Até ousa lutar com Deus. Mas precisa ser quebrantado. E isso lhe rendeu a mudança de nome para Israel (= Deus prevalece).

Essas biografias não escondem as fraquezas e defeitos desses indivíduos e famílias. Foram pessoas fortemente atingidas pelos efeitos do pecado na vida humana. Cometeram mais erros do que acertos na sua relação com Deus, com a família, com o trabalho e com a sociedade. Tenho a impressão que essas histórias resumem como o ser humano quer sempre ser mais que Deus ou ser o seu próprio Deus e tirar vantagem do outro. O mais impressionante é que foram instrumentos assim que Deus usou para realizar o seu propósito. Não existe família perfeita, mas famílias que seguem a Deus e se deixam ser usadas por Deus.


Nota:
1 Cassuto, 1989, p. 303.

William Lacy Lane (billy) - Pastor presbiteriano, doutor em Antigo Testamento e diretor acadêmico da Faculdade Teológica Sul-Americana, em Londrina (PR).


Fonte: http://www.ultimato.com.br/conteudo/o-que-os-pais-de-familia-da-biblia-nos-ensinam

domingo, 21 de maio de 2017

O Deus que tudo controla


Por Jen Wilkin


Porque nosso Deus controla todas as coisas, ele pode, em última análise, operar tudo para o nosso bem, mesmo aquelas coisas que para outros signifique o mal. Os teólogos falam de sua vontade ativa e sua vontade passiva. Ele trabalha ativamente por meio de nossa obediência, mas também trabalha passivamente por meio de nossa desobediência, como no caso dos irmãos de José, o qual reconheceu que Deus havia usado o que eles intentaram para o mal a fim de realizar seus bons propósitos.

Embora Deus controle todas as coisas, aqueles que fazem o mal ainda são responsáveis por suas escolhas pecaminosas. Como pode ser isso? Como podemos ser responsáveis por nossas escolhas se Deus é soberano? A soberania divina e a responsabilidade humana são verdades paralelas que devemos sustentar simultaneamente. A Bíblia afirma com veemência a soberania total de Deus e a livre agência do homem. O mesmo Jesus que disse: “Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o trouxer”, também diz: “Venham a mim, todos os que estão cansados e sobrecarregados, e eu lhes darei descanso” (Jo 6.44; Mt 11.28, NVI). Em nosso estado pecaminoso caído, não temos disposição natural de ir a Deus. Então, Deus nos regenera e muda a disposição de nosso coração, e, assim, de nossa própria vontade, a qual agora é liberta da escravidão, nós voluntariamente respondemos à sua chamada para irmos até ele e sermos salvos. Se nós, seres humanos, não pudéssemos fazer escolhas genuínas e responsáveis, então Deus seria injusto por nos punir pelo pecado. De fato, ele seria até responsável pelo pecado.

Como a nossa livre agência e a soberania de Deus podem coexistir é um mistério. No momento em que o humano e o divino se cruzarem, o paradoxo surgirá e nossas limitações humanas obscurecerão a forma como dois pontos aparentemente contraditórios conseguem ser ambos verdadeiros. É bom que lidemos com o paradoxo, mas se permitirmos que eles tirem nossos olhos de uma questão de maior relevância, perderemos o que é importante de verdade. E a questão é esta: quão comprometida você está com o mito de sua soberania própria?

Para chegar a uma resposta honesta, considere quatro áreas nas quais nós lutamos por controle.

1.    Controlando nossos corpos
A forma como nos relacionamos com nossos corpos revela muito de nossa necessidade por controle. Cuidar de nossos corpos é uma questão de mordomia. Eles não são nossos. Eles nos foram dados para mantê-los em caminhos saudáveis. Mas quando ultrapassamos o limite e adentramos o controle doentio, passamos da mordomia para a idolatria. Isso pode adquirir a forma de preocupação obsessiva com dietas e exercícios, transtornos alimentares, medo excessivo de doenças e germes, hipocondria, medo de envelhecer ou apenas vaidade.

Como podemos saber quando ultrapassamos os limites da mordomia e passamos para o controle? Certamente, pelo impacto em nosso tempo, mas também pelo impacto em nossas palavras e em nossas carteiras. Quando desejamos o controle doentio sobre os nossos corpos, falamos sobre eles constantemente. Nossos métodos, expectativas e resultados conseguem entrar em nossas conversas e nas postagens das redes sociais. Racionalizamos o custo final de qualquer suplemento, procedimento médico, creme antienvelhecimento ou mensalidade de academia, considerando-os necessários para alcançar o nosso objetivo corporal.

Em última análise, nossa necessidade por controle impacta os nossos relacionamentos de maneira negativa. Julgamos aqueles que não seguem o nosso regime restrito, desprezando-os como indisciplinados quanto à sua saúde ou descuidados com sua aparência. E priorizamos nosso tempo livre e nossos recursos para nós mesmas ao invés de para os outros.

2. Controlando nossas posses
Assim como os nossos corpos, nossas posses são para a mordomia, não para fazermos com elas o que quisermos. Não é errado ter coisas, é apenas errado adorá-las. Quando ultrapassamos o limite e entramos no controle doentio, desenvolvemos uma preocupação obsessiva em adquirir, multiplicar e manter o que temos. Isso pode se manifestar na forma de acumulação, compra compulsiva, medo de usar o que se tem, porque pode ser danificado ou desgastado, cuidado compulsivo de uma propriedade, gerenciamento financeiro muito minucioso ou inabilidade de emprestar ou dar coisas a outros.

Acaso um arranhão em seu carro lhe mata? O fato de seu carro estar meticulosamente preservado é uma fonte de orgulho para você? A forma como nós reagimos ao dano ou à perda de posses revela se temos problemas de controle nessa área. Acumular dívidas para manter um estilo de vida é algo racional para você? Algo pode estar errado com a maneira como você enxerga suas coisas.

3. Controlando nossos relacionamentos
Todo relacionamento humano que nós temos é ordenado por Deus e é uma oportunidade de demonstrar amor preferencial a outra pessoa feita à imagem dele. Conflitos de relacionamento estão sempre ligados ao controle. Um desejo por controle doentio em um relacionamento pode se manifestar na forma de intimidação ou manipulação (verbal, emocional, física), marcas características do abuso. Sabemos como são os extremos — nós assistimos a eles nos jornais à noite ou temos a tristeza de conhecê-los pessoalmente. A maioria de nós não se encaixa na categoria “agressores”, mas isso não significa que não somos controladores em algum nível.

Formas menores de controle se revelam como uma inabilidade de admitir que estamos erradas, uma necessidade de se ter a última palavra, uma necessidade de ser severa, uma atitude de “ou aceita ou cai fora”. Se nos comportamos dessa forma com uma criança, um cônjuge, uma amiga, um colega de trabalho, estamos exercitando controle de uma maneira não saudável.

Nenhuma situação é mais difícil de não exercer um comportamento controlador do que com aqueles sobre quem temos autoridade legítima. Pais, líderes de igrejas e líderes de negócios que amam excessivamente o controle irão cair num estilo de liderança autoritário, uma liderança que torna as regras mais importantes que os relacionamentos. Estar em posição de autoridade significa colocar limites para preservar o relacionamento. Não significa colocar limites que impeçam o relacionamento.

Uma amiga, certa vez, me contou que quando seus filhos se acusavam no meio de uma briga (uma batalha óbvia por controle), ela perguntava: “quem está sendo o mais gentil?”. Que pergunta inteligente para se fazer sobre qualquer conflito de relacionamento. O amor preferencial pelos outros requer dominarmos nosso desejo de controlá-los. Você permite que o mau humor faça com que os outros fiquem pisando em ovos com você? Você espera que os outros sejam capazes de ler sua mente quando seus sentimentos estão feridos? Há algo implícito no seu discurso? Escolha a gentileza ao invés de optar pelo controle e veja seus relacionamentos se tornarem saudáveis.

4. Controlando nossas circunstâncias e ambientes
A vida é incerta. Embora Deus conheça o futuro, nós não o conhecemos, e a maior parte de nós não lida bem com a ambiguidade. Aqueles que querem controlar as circunstâncias tentam se precaver para cada contingência. Eles planejam demasiadamente, transformando as tarefas mais simples nos maiores empreendimentos. Quanto menos controle eles percebem ter, mais comportamento controlador demonstram. Eles se sentam ao lado do motorista, oferecem conselho ou “ajuda” não solicitados em projetos e situações que não os envolvem diretamente, são servilmente pontuais quando ninguém está esperando por eles e lutam contra um desejo dominador de ser a pessoa que possui o controle remoto. Eles sabem a melhor forma de encher uma lava-louças, rearranjando-a, de modo sorrateiro, quando acham que ninguém está vendo.

Eles separam o lixo para a reciclagem quando a festa acaba, não importando quão tarde seja ou quão grande seja a quantidade de lixo. Eles não conseguem dormir até que tudo esteja realmente feito. Desenvolvem rotinas e rituais dos quais dependem para ter paz mental. As regras existem para tudo, desde a ordem em que devem comer a comida de um prato até como organizar adequadamente uma gaveta de meias. Se o espelho está torto na parede, você consegue passar por ele sem consertá-lo? Se não consegue, separe algum tempo para olhar para ele enquanto o arruma. Eu sei que tive de fazer isso para elaborar esses exemplos. Nem todos eles se adéquam a mim, mas muitos deles, sim. Ninguém me acusaria de ser compulsivamente pontual, mas sou bem conhecida por ser como um fariseu no que concerne à reciclagem e uma legalista da lava-louças. Você não precisa ser diagnosticada com transtorno obsessivo compulsivo para ter problemas com o controle sobre as circunstâncias e os ambientes. Precisa apenas ser um humano limitado.

Derrubando o mito da soberania humana
Quando buscamos controle, declaramos nossa crença de que nós, ao invés de um Deus onisciente, onividente, onipotente e infinitamente bom, deveríamos controlar o universo. Nossos problemas com controle surgem da especulação “e se”. Nossa inabilidade de responder à pergunta “e se” definitivamente causa ansiedade — ansiedade sobre a probabilidade de o nosso reino vir e de a nossa vontade ser feita. Meu esposo sempre acalma minha ansiedade apontando-me para uma questão importante: qual é a pior hipótese? Falar sobre os meus medos quanto às situações, aos relacionamentos, às posses, ou ao meu corpo ajuda a me acalmar. Ou, mais precisamente, isso me ajuda a deixá-los aos pés do meu Pai celestial. É uma forma de confissão, deixar a minha boca falar aquilo de que está cheio o meu coração, dando voz aos meus incômodos medos e abandonando a minha necessidade por controle. É um reconhecimento de que o reino pertence a Deus.

Teu, SENHOR, é o poder, a grandeza, a honra, a vitória e a majestade; porque teu é tudo quanto há nos céus e na terra; teu, SENHOR, é o reino, e tu te exaltaste por chefe sobre todos. Riquezas e glória vêm de ti, tu dominas sobre tudo, na tua mão há força e poder; contigo está o engrandecer e a tudo dar força (1Cr 29.11-12).

Soberano
Assim disse o rei Davi ao Rei dos Céus. E assim digo eu.

Sobre o que eu tenho controle? Sobre algumas coisas muito importantes. Meus pensamentos, os quais posso tornar cativos pelo poder do Espírito Santo. E se posso controlar meus pensamentos, posso controlar também a minha atitude — para com o meu corpo, minhas coisas, meus relacionamentos e minhas circunstâncias. Se meus pensamentos e minha atitude estão sob controle, minhas palavras também estarão, assim como as minhas ações. Os redimidos, de maneira obediente, submetem pensamentos, palavras e ações ao seu Senhor celestial, confiando a incerteza àquele que “faz todas as coisas conforme o conselho da sua vontade” (Ef 1.11). Eles se afastam do trono, reconhecendo que são completamente desqualificados para se sentarem nele.

Por quanto tempo mais você lutará com o seu Criador? Por quanto tempo mais você buscará o lugar mais alto? Jesus Cristo desceu ao lugar mais baixo para que você e eu pudéssemos ter comunhão com Deus. Por isso, o Pai o exaltou. Portanto, humilhe-se. O que é mais belamente humilde do que abandonar o controle?

Os melhores contadores de história da minha infância se valiam de uma fórmula de sucesso. Toda história verdadeiramente boa faz eco à melhor história de todas. A Bíblia narra a história de um rei cuja reivindicação ao trono é reconhecida desde o começo, mas cujas majestade e autoridade são apenas apreendidas por completo nas páginas finais quando o vemos, enfim, coroado e reinando. Sua fiel declaração anunciada do trono é esta: “Eis que faço novas todas as coisas” (Ap 21.5).

“No céu está o nosso Deus e tudo faz como lhe agrada” (Sl 115.3). E tudo que lhe agrada é para o nosso bem.


Por: Jen Wilkin. © 2017 Editora Fiel. Website: editorafiel.com.br . Traduzido com permissão. Fonte: Trecho retirado do livro Incomparável

Original: O Deus que tudo controla. © Ministério Fiel. Website: MinisterioFiel.com.br. Todos os direitos reservados.

JEN WILKIN é palestrante, professora de estudos bíblicos para mulheres e autora do livro Mulheres da Palavra (Fiel). Jen e sua família são membros da Village Church, na região de Dallas.