Por Hermes C. Fernandes
“Um outro mundo é possível!” Esta frase sintetiza o ideal de pessoas como Gandhi, Madre Teresa de Calcutá, Martin Luther King, John Lennon e outros. Mesmo alguém como Che Guevara, a quem se atribui tantos crimes praticados na guerrilha, acreditava piamente em seu ideal, e por ele se dispunha a morrer. Por isso, fiz questão de inclui-lo em minha pequena lista de ícones idealistas do último século. Apesar de confessarem credos diferentes, ou de atuarem em frentes diversas, ou utilizarem métodos questionáveis, o que essas pessoas tinham em comum era o idealismo, ítem cada vez mais raro em nossos dias.
Não compro pacotes fechados! Posso admirar e até inspirar-me no idealismo de alguém, sem com isso abraçar sua ideologia. Posso compartilhar de seus sonhos, sem comprometer-me com seus métodos. Posso almejar atingir seus alvos, sem sentir-me obrigado a percorrer seu caminho.
Alguns podem protestar pelo fato de incluir pessoas de outras religiões em minha lista. O que diriam de Paulo, que em sua pregação no Areópago de Atenas, citou filósofos gregos pagãos?
Será que jamais ouviram falar de “graça comum”?
Posso reconhecê-la no brilho do olhar de um jovem idealista, ainda que este se pronuncie ateu. Posso reconhecê-la nas linhas harmônicas das obras arquitetônicas de Niemeyer, outro célebre idealista ateu. Se tão-somente nos livrássemos de nosso preconceito, quanto da graça não identificaríamos naqueles que sonham e trabalham por um mundo diferente! Mas em vez disso, preferimos o gueto, o evangeliquêsinsosso, a espiritualidade alienante e entorpecente. Por favor, não se sintam agredidos. Se sou pesado em palavras é porque almejo despertar sua consciência.
E quanto àqueles a quem consideramos os ícones do que chamamos de sucesso? Uns começaram de baixo, e alcançaram posições tão sonhadas por muitos de nós, pobres mortais. Outros, como Paris Hilton, são herdeiros de enormes fortunas. Conquanto tenham origens diferentes, têm em comum o fato de haverem perseguido e realizado seus sonhos pessoais. Algum demérito nisso? Não! O problema é que a maioria deles tem a oportunidade de mudar o mundo, mas não a aproveita, simplesmente porque seu sucesso depende das coisas como elas são. É aquela velha estória: em terra de cego, quem tem um olho é rei.
Quem, neste mundo, chega a ser um bilionário sem ter que transigir com alguns princípios?
É verdade que alguns deles, como Bill Gates, por exemplo, são filantropos, isto é, distribuem parte de sua fortuna para obras de caridade em todo o mundo. Palmas para ele! Porém, o que o mundo precisa não é meramente de filantropia, e sim de justiça. O mesmo Bill Gates já comprou muitas pequenas empresas de software, para coibir a concorrência. Não foi em vão que Paulo denunciou a possibilidade de se distribuir bens para os pobres, sem necessariamente ser motivado por amor. Muitos bilionários o fazem pra aumentar a credibilidade de suas marcas junto a opinião pública. Não posso afirmar ser este o caso do dono da Microsoft, mas certamente é o caso de inúmeros outros.
Se você tivesse a oportunidade de associar sua imagem a um destes grupos, em qual deles você se sentiria mais confortável? Talvez você preferisse ter sua foto vinculada a figuras como Billy Graham, ou Mandela, não por acreditar no mesmo idealismo que os motivava, mas por querer ficar bem na fita. Lembre-se que Deus não julgará apenas nossas ações, mas também nossas motivações.
Sinceramente, quem não gostaria de ter seu rosto figurando naquele panteão de pessoas famosas e bem-sucedidas? Será que vale a pena viver por isso?
O evangelho da prosperidade insiste que sim. Para seus defensores, o importante é ter, mesmo que em detrimento do ser.
Na concepção do mundo, sucesso é concentrar riquezas e ser reconhecido por aquilo que faz. Porém, na concepção genuinamente cristã, sucesso é fazer de sua vida um motivo de gratidão a Deus por parte daqueles que se beneficiam dela.
Aos olhos de Deus, bem-sucedido é quem vive em função do bem-comum, e não de seus próprios sonhos de consumo.
Qualquer um dos que figuram na lista de celebridades, caso se encontrasse com Jesus, ouviria d’Ele o mesmo que o jovem rico ouviu: “Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens e dá-o aos pobres, e terás um tesouro no céu. Então vem, e segue-me” (Mt.19:21). Será que algum dentre eles se habilitaria? E você?
Na há mensagem mais subversiva do que a pregada por Aquele jovem Galileu revolucionário de cabelos cumpridos. Quem ousa vivê-la às últimas consequências?
Chega deste lixo de teologia da prosperidade! Chega deste desevangelho medíocre, que só faz estimular nas pessoas o pior que há em sua natureza. Que nossos ícones sejam outros, em vez daqueles oferecidos pelo capitalismo selvagem. Que nos inspiremos em homens como Francisco de Assis, que peitou o Papa e o desafiou a voltar à simplicidade do Evangelho. Ou em homens como Dietrich Bonhoeffer, o ministro alemão que resistiu ao nazismo de Hitler, pagando com sua própria vida.
Lembre-se que os discípulos de Jesus foram reconhecidos originalmente como aqueles que estavam colocando o mundo de pernas pro ar.
Rompa com o sistema! Não seja mais uma engrenagem dele. Sabote-o! Torne-se num discípulo subversivo de alta periculosidade. Denuncie o erro. Encarne a mensagem. Aponte o caminho para as próximas gerações.
Longa vida à revolução reinista!