Por Jen Wilkin
Porque nosso Deus controla todas as coisas, ele pode, em última análise, operar tudo para o nosso bem, mesmo aquelas coisas que para outros signifique o mal. Os teólogos falam de sua vontade ativa e sua vontade passiva. Ele trabalha ativamente por meio de nossa obediência, mas também trabalha passivamente por meio de nossa desobediência, como no caso dos irmãos de José, o qual reconheceu que Deus havia usado o que eles intentaram para o mal a fim de realizar seus bons propósitos.
Embora Deus controle todas as coisas, aqueles que fazem o mal ainda são responsáveis por suas escolhas pecaminosas. Como pode ser isso? Como podemos ser responsáveis por nossas escolhas se Deus é soberano? A soberania divina e a responsabilidade humana são verdades paralelas que devemos sustentar simultaneamente. A Bíblia afirma com veemência a soberania total de Deus e a livre agência do homem. O mesmo Jesus que disse: “Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o trouxer”, também diz: “Venham a mim, todos os que estão cansados e sobrecarregados, e eu lhes darei descanso” (Jo 6.44; Mt 11.28, NVI). Em nosso estado pecaminoso caído, não temos disposição natural de ir a Deus. Então, Deus nos regenera e muda a disposição de nosso coração, e, assim, de nossa própria vontade, a qual agora é liberta da escravidão, nós voluntariamente respondemos à sua chamada para irmos até ele e sermos salvos. Se nós, seres humanos, não pudéssemos fazer escolhas genuínas e responsáveis, então Deus seria injusto por nos punir pelo pecado. De fato, ele seria até responsável pelo pecado.
Como a nossa livre agência e a soberania de Deus podem coexistir é um mistério. No momento em que o humano e o divino se cruzarem, o paradoxo surgirá e nossas limitações humanas obscurecerão a forma como dois pontos aparentemente contraditórios conseguem ser ambos verdadeiros. É bom que lidemos com o paradoxo, mas se permitirmos que eles tirem nossos olhos de uma questão de maior relevância, perderemos o que é importante de verdade. E a questão é esta: quão comprometida você está com o mito de sua soberania própria?
Para chegar a uma resposta honesta, considere quatro áreas nas quais nós lutamos por controle.
1. Controlando nossos corpos
A forma como nos relacionamos com nossos corpos revela muito de nossa necessidade por controle. Cuidar de nossos corpos é uma questão de mordomia. Eles não são nossos. Eles nos foram dados para mantê-los em caminhos saudáveis. Mas quando ultrapassamos o limite e adentramos o controle doentio, passamos da mordomia para a idolatria. Isso pode adquirir a forma de preocupação obsessiva com dietas e exercícios, transtornos alimentares, medo excessivo de doenças e germes, hipocondria, medo de envelhecer ou apenas vaidade.
Como podemos saber quando ultrapassamos os limites da mordomia e passamos para o controle? Certamente, pelo impacto em nosso tempo, mas também pelo impacto em nossas palavras e em nossas carteiras. Quando desejamos o controle doentio sobre os nossos corpos, falamos sobre eles constantemente. Nossos métodos, expectativas e resultados conseguem entrar em nossas conversas e nas postagens das redes sociais. Racionalizamos o custo final de qualquer suplemento, procedimento médico, creme antienvelhecimento ou mensalidade de academia, considerando-os necessários para alcançar o nosso objetivo corporal.
Em última análise, nossa necessidade por controle impacta os nossos relacionamentos de maneira negativa. Julgamos aqueles que não seguem o nosso regime restrito, desprezando-os como indisciplinados quanto à sua saúde ou descuidados com sua aparência. E priorizamos nosso tempo livre e nossos recursos para nós mesmas ao invés de para os outros.
2. Controlando nossas posses
Assim como os nossos corpos, nossas posses são para a mordomia, não para fazermos com elas o que quisermos. Não é errado ter coisas, é apenas errado adorá-las. Quando ultrapassamos o limite e entramos no controle doentio, desenvolvemos uma preocupação obsessiva em adquirir, multiplicar e manter o que temos. Isso pode se manifestar na forma de acumulação, compra compulsiva, medo de usar o que se tem, porque pode ser danificado ou desgastado, cuidado compulsivo de uma propriedade, gerenciamento financeiro muito minucioso ou inabilidade de emprestar ou dar coisas a outros.
Acaso um arranhão em seu carro lhe mata? O fato de seu carro estar meticulosamente preservado é uma fonte de orgulho para você? A forma como nós reagimos ao dano ou à perda de posses revela se temos problemas de controle nessa área. Acumular dívidas para manter um estilo de vida é algo racional para você? Algo pode estar errado com a maneira como você enxerga suas coisas.
3. Controlando nossos relacionamentos
Todo relacionamento humano que nós temos é ordenado por Deus e é uma oportunidade de demonstrar amor preferencial a outra pessoa feita à imagem dele. Conflitos de relacionamento estão sempre ligados ao controle. Um desejo por controle doentio em um relacionamento pode se manifestar na forma de intimidação ou manipulação (verbal, emocional, física), marcas características do abuso. Sabemos como são os extremos — nós assistimos a eles nos jornais à noite ou temos a tristeza de conhecê-los pessoalmente. A maioria de nós não se encaixa na categoria “agressores”, mas isso não significa que não somos controladores em algum nível.
Formas menores de controle se revelam como uma inabilidade de admitir que estamos erradas, uma necessidade de se ter a última palavra, uma necessidade de ser severa, uma atitude de “ou aceita ou cai fora”. Se nos comportamos dessa forma com uma criança, um cônjuge, uma amiga, um colega de trabalho, estamos exercitando controle de uma maneira não saudável.
Nenhuma situação é mais difícil de não exercer um comportamento controlador do que com aqueles sobre quem temos autoridade legítima. Pais, líderes de igrejas e líderes de negócios que amam excessivamente o controle irão cair num estilo de liderança autoritário, uma liderança que torna as regras mais importantes que os relacionamentos. Estar em posição de autoridade significa colocar limites para preservar o relacionamento. Não significa colocar limites que impeçam o relacionamento.
Uma amiga, certa vez, me contou que quando seus filhos se acusavam no meio de uma briga (uma batalha óbvia por controle), ela perguntava: “quem está sendo o mais gentil?”. Que pergunta inteligente para se fazer sobre qualquer conflito de relacionamento. O amor preferencial pelos outros requer dominarmos nosso desejo de controlá-los. Você permite que o mau humor faça com que os outros fiquem pisando em ovos com você? Você espera que os outros sejam capazes de ler sua mente quando seus sentimentos estão feridos? Há algo implícito no seu discurso? Escolha a gentileza ao invés de optar pelo controle e veja seus relacionamentos se tornarem saudáveis.
4. Controlando nossas circunstâncias e ambientes
A vida é incerta. Embora Deus conheça o futuro, nós não o conhecemos, e a maior parte de nós não lida bem com a ambiguidade. Aqueles que querem controlar as circunstâncias tentam se precaver para cada contingência. Eles planejam demasiadamente, transformando as tarefas mais simples nos maiores empreendimentos. Quanto menos controle eles percebem ter, mais comportamento controlador demonstram. Eles se sentam ao lado do motorista, oferecem conselho ou “ajuda” não solicitados em projetos e situações que não os envolvem diretamente, são servilmente pontuais quando ninguém está esperando por eles e lutam contra um desejo dominador de ser a pessoa que possui o controle remoto. Eles sabem a melhor forma de encher uma lava-louças, rearranjando-a, de modo sorrateiro, quando acham que ninguém está vendo.
Eles separam o lixo para a reciclagem quando a festa acaba, não importando quão tarde seja ou quão grande seja a quantidade de lixo. Eles não conseguem dormir até que tudo esteja realmente feito. Desenvolvem rotinas e rituais dos quais dependem para ter paz mental. As regras existem para tudo, desde a ordem em que devem comer a comida de um prato até como organizar adequadamente uma gaveta de meias. Se o espelho está torto na parede, você consegue passar por ele sem consertá-lo? Se não consegue, separe algum tempo para olhar para ele enquanto o arruma. Eu sei que tive de fazer isso para elaborar esses exemplos. Nem todos eles se adéquam a mim, mas muitos deles, sim. Ninguém me acusaria de ser compulsivamente pontual, mas sou bem conhecida por ser como um fariseu no que concerne à reciclagem e uma legalista da lava-louças. Você não precisa ser diagnosticada com transtorno obsessivo compulsivo para ter problemas com o controle sobre as circunstâncias e os ambientes. Precisa apenas ser um humano limitado.
Derrubando o mito da soberania humana
Quando buscamos controle, declaramos nossa crença de que nós, ao invés de um Deus onisciente, onividente, onipotente e infinitamente bom, deveríamos controlar o universo. Nossos problemas com controle surgem da especulação “e se”. Nossa inabilidade de responder à pergunta “e se” definitivamente causa ansiedade — ansiedade sobre a probabilidade de o nosso reino vir e de a nossa vontade ser feita. Meu esposo sempre acalma minha ansiedade apontando-me para uma questão importante: qual é a pior hipótese? Falar sobre os meus medos quanto às situações, aos relacionamentos, às posses, ou ao meu corpo ajuda a me acalmar. Ou, mais precisamente, isso me ajuda a deixá-los aos pés do meu Pai celestial. É uma forma de confissão, deixar a minha boca falar aquilo de que está cheio o meu coração, dando voz aos meus incômodos medos e abandonando a minha necessidade por controle. É um reconhecimento de que o reino pertence a Deus.
Teu, SENHOR, é o poder, a grandeza, a honra, a vitória e a majestade; porque teu é tudo quanto há nos céus e na terra; teu, SENHOR, é o reino, e tu te exaltaste por chefe sobre todos. Riquezas e glória vêm de ti, tu dominas sobre tudo, na tua mão há força e poder; contigo está o engrandecer e a tudo dar força (1Cr 29.11-12).
Soberano
Assim disse o rei Davi ao Rei dos Céus. E assim digo eu.
Sobre o que eu tenho controle? Sobre algumas coisas muito importantes. Meus pensamentos, os quais posso tornar cativos pelo poder do Espírito Santo. E se posso controlar meus pensamentos, posso controlar também a minha atitude — para com o meu corpo, minhas coisas, meus relacionamentos e minhas circunstâncias. Se meus pensamentos e minha atitude estão sob controle, minhas palavras também estarão, assim como as minhas ações. Os redimidos, de maneira obediente, submetem pensamentos, palavras e ações ao seu Senhor celestial, confiando a incerteza àquele que “faz todas as coisas conforme o conselho da sua vontade” (Ef 1.11). Eles se afastam do trono, reconhecendo que são completamente desqualificados para se sentarem nele.
Por quanto tempo mais você lutará com o seu Criador? Por quanto tempo mais você buscará o lugar mais alto? Jesus Cristo desceu ao lugar mais baixo para que você e eu pudéssemos ter comunhão com Deus. Por isso, o Pai o exaltou. Portanto, humilhe-se. O que é mais belamente humilde do que abandonar o controle?
Os melhores contadores de história da minha infância se valiam de uma fórmula de sucesso. Toda história verdadeiramente boa faz eco à melhor história de todas. A Bíblia narra a história de um rei cuja reivindicação ao trono é reconhecida desde o começo, mas cujas majestade e autoridade são apenas apreendidas por completo nas páginas finais quando o vemos, enfim, coroado e reinando. Sua fiel declaração anunciada do trono é esta: “Eis que faço novas todas as coisas” (Ap 21.5).
“No céu está o nosso Deus e tudo faz como lhe agrada” (Sl 115.3). E tudo que lhe agrada é para o nosso bem.
Por: Jen Wilkin. © 2017 Editora Fiel. Website: editorafiel.com.br . Traduzido com permissão. Fonte: Trecho retirado do livro Incomparável
Original: O Deus que tudo controla. © Ministério Fiel. Website: MinisterioFiel.com.br. Todos os direitos reservados.
JEN WILKIN é palestrante, professora de estudos bíblicos para mulheres e autora do livro Mulheres da Palavra (Fiel). Jen e sua família são membros da Village Church, na região de Dallas.