sexta-feira, 25 de julho de 2014

As fontes e o laço

Imagem: :Laço (1956), Escher

Por Leonel Eliseu Valer Dos Santos

“O temor do Senhor é fonte de vida, para desviar dos laços da morte.” Prov; 14; 27

Uma fonte é geratriz de um bem precioso que flui de modo ininterrupto. O temor do Senhor ( reverência santa, reconhecimento de autoridade ) é posto aqui como fonte de vida, em oposição aos laços da morte. Manancial existe para dar-se em prol da necessidade de outrem; laço, para caçar algo pra si. Assim, aquela gera um bem, esse, busca tomar de modo ardiloso o que lhe não pertence. Um caçador cuida de suas necessidades; uma fonte supre necessidades alheias.

Então, o temor do Senhor há de obrar em nós algum cuidado com as carências de terceiros, antes, que com as nossas. Claro que, quem acende uma luz é o primeiro a ser iluminado; desse modo o que teme ao Senhor usufrui para si, a vida, antes de comunicar a outros.

Mas, por que a morte armaria laços? Tem necessidade de matar? Não. Quando diz laços da morte está adjetivando os laços, não, identificando o caçador. O interesse na difusão da morte é do pai da mentira, o ladrão da vida que o Salvador denunciou: “O ladrão não vem senão a roubar, matar e destruir; eu vim para que tenham vida, e a tenham com abundância.” Jo 10; 10

A figura do laço do passarinheiro é usada tanto para identificar o agir do inimigo, quanto de seus servos. “Porque ele ( O Senhor ) te livrará do laço do passarinheiro, e da peste perniciosa.” Sal 91; 3 “Porque ímpios se acham entre o meu povo; andam espiando, como quem arma laços; põem armadilhas, com que prendem os homens. Como uma gaiola está cheia de pássaros, assim as suas casas estão cheias de engano; por isso se engrandeceram, e enriqueceram;” Jr 5; 26 e 27 Qualquer semelhança com políticos e mercenários religiosos de nossos dias não é mera coincidência.

Assim, se o laço é um obreiro de morte, também o é de grandes riquezas nas mãos dos laçadores, como vemos no exemplo supra. O início duma caminhada pode dissimular seu fim. “Há um caminho que ao homem parece direito, mas o fim dele são os caminhos da morte.” Prov 14; 12 Não que a riqueza, o desfrute de posses seja em si algo mau; mas, se for de modo divorciado do Senhor será uma vastidão desértica, privada de vida.

Quando Calebe deu a sua filha e genro a posse de um campo assim, Otoniel instou que sua esposa pedisse algo mais para que os bens fizessem sentido. “E sucedeu que, indo ela a ele, a persuadiu que pedisse um campo a seu pai; e ela desceu do jumento, e Calebe lhe disse: Que é que tens? E ela lhe disse: Dá-me uma bênção; pois me deste uma terra seca, dá-me também fontes de águas. E Calebe lhe deu as fontes superiores e as fontes inferiores.” Jz 1; 14 e 15 Tanto quanto uma vasta extensão de terra não faz sentido sem água, o domínio de muitos bens sem temor do Senhor, não passa de uma ostensiva queda nos laços da morte.

Quando o relato afirma que Calebe deu fontes superiores e inferiores, refere-se, ao relevo onde as águas brotavam. Mas, Deus tem fontes superiores, espirituais, que devem ser buscadas antes que as inferiores, materiais. Inverter essa ordem não faria o menor sentido. Pleitear bens antes da vida seria como pedir em favor de um morto. A questão primordial é a regeneração da vida. “Jesus respondeu, e disse-lhe: Na verdade, na verdade te digo que aquele que não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus.” Jo 3; 3

Certo é que Deus faz a chuva e o sol incidirem sobre justos e injustos, como demonstração de seu amor e graça sobre todo a criatura. Entretanto, bênçãos específicas demandam relacionamento com Ele, que vai além da situação de criatura. O novo nascimento em Cristo nos coloca na condição de filhos adotivos; isso traz privilégios e responsabilidades especiais. O privilégio maior é que livra dos laços da morte; a responsabilidade mor é que devemos andar no temor do Senhor.

Fazendo isso, nem nos ocuparemos tanto das fontes inferiores, dado que, Ele ordenou: “Mas, buscai primeiro o reino de Deus, e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas.” Mat 6; 33

Afinal, assim como águas nascendo em lugares altos terminam irrigando também os vales, uma vida espiritual plena acabará sendo plena em tudo. Se bênçãos materiais vierem trarão proveito pra muitos necessitados; se privações concorrerem, será pra que nossa constância na adversidade mane riquezas superiores aos que contemplam de fora e precisam aprender a escala de valores do céu.

Fonte: http://www.ultimato.com.br/comunidade-conteudo/as-fontes-e-o-laco

terça-feira, 15 de julho de 2014

A tentação política e a ética da renúncia

Paul Freston

“Se me adorares, tudo será teu.” (Lc 4.7)

A segunda tentação de Cristo é uma espécie de visão. Talvez provocada pela vista do pico de uma montanha real.

Tente visualizar a cena: o deserto rochoso e montanhoso, Jesus subindo um morro, arrastando-se sobre as rochas, chegando ofegante em cima. A vista é espetacular; lá em baixo, várias cidadezinhas espalhadas. Jesus olha e, de repente, em sua imaginação, vê as grandes cidades do mundo, os palácios e os templos, os reis e os imperadores, o ouro e a prata, os campos, as oficinas, as minas. Agora, vê as ruas cheias de gente, oprimida, miserável, supersticiosa.

Então, em sua mente, vem a sugestão: “Jesus, está vendo aquelas cidades lá em baixo? De direito, você é quem teria autoridade sobre elas. E não só sobre elas. Pense também em Jerusalém, Damasco, Antioquia, Alexandria, Atenas, Roma... Você não seria um governante mais justo? Não teria ideias para dar paz e prosperidade a esses povos? O mundo clama por seu governo. Você é a resposta. (Sofremos muito na igreja por não entender como o Diabo é um bom crente.) Mas o caminho da cruz é muito lento. A maioria não vai nem entender direito. Não faz mais sentido pensar num caminho mais rápido e mais compreensível para a maioria? Veja, há um caminho. Não vou exigir que você me adore publicamente. Só que você deixe de lado essa ideia da cruz. E você sabe muito bem que eu tenho o poder de fazer com que você seja reconhecido como governante. Os povos precisam. A cruz é lenta”.

O Diabo vai falando ritmicamente, como se batendo num tambor. “Os povos precisam. A cruz é lenta. Os povos precisam. A necessidade é urgente. O desgoverno é um escândalo. Considere minha proposta. Pense bem. Curve-se. Só um pouquinho. Ninguém vai ver. Ninguém vai saber. Curve-se. Só um pouco. Curve-se...”. Jesus, atormentado, fecha os olhos e cerra os punhos. Finalmente, grita: “Não!”. O Diabo se cala. Em agonia, Jesus gagueja: “Ao Senhor teu Deus adorarás, e só a ele darás culto”.

Ultimamente, uma nova teologia vem ganhando espaço no meio evangélico, oriunda da direita cristã dos Estados Unidos. “Nosso destino é governar as nações”, diz ela. A Bíblia promete aos cristãos o domínio político sobre todas as nações. Sua ideia de uma sociedade cristã é uma mistura de teocracia e darwinismo social (a sobrevivência dos mais aptos). Segundo um defensor dessa linha, “as sociedades chamadas subdesenvolvidas o são porque são socialistas, demonistas e amaldiçoadas”. Criticando o dispensacionalismo (com sua doutrina do “arrebatamento”) como uma escatologia derrotista, afirmam que os cristãos serão cogovernantes com Cristo.1

O problema com esse enfoque, embora tenha a grande virtude de questionar a escatologia escapista do dispensacionalismo, é que confunde “alhos com bugalhos”. O modelo do cristão é o modelo de Cristo em sua primeira vinda, o modelo da cruz e do serviço humilde. E a glória reconhecível que Cristo terá em sua segunda vinda não dispensa esse modelo, apenas revela que o serviço é, de fato, a verdadeira glória, o verdadeiro governo. A questão essencial no tocante ao poder não é a sua posse ou não. Jesus sabia que, mais cedo ou mais tarde, teria o poder. Porém, a questão é quando e como, e com que mentalidade (triunfalista ou serviçal). Os cristãos que dizem que o poder nos pertence, de direito, aqui e agora, estão aceitando o atalho que o Diabo oferece a Jesus: governo sem cruz. Acham que o cuidado que Jesus precisou ter para não sucumbir a essa tentação não é necessário para eles. O caminho deles pode ser mais curto do que o de Jesus. Além do mais, “os povos precisam...”.

Oramos para que Deus facilite nosso caminho e nosso ministério. Mas às vezes o caminho fácil é uma tentação a ser resistida!

O Diabo diz que a glória dos reinos “me foi entregue e eu a dou a quem eu quiser”. Muitas vezes o Diabo é chamado “o príncipe deste mundo” (por exemplo, em João 12.31), mas em última análise essa reivindicação é falsa. O “mundo” (no sentido da sociedade humana organizada em oposição aos valores do reino de Deus) se entrega ao Diabo, mas o mundo (no sentido de mundo habitado) continua sendo objeto do amor e da ação de Deus.

Na frase “a glória me foi entregue”, o Diabo é obrigado a confessar o caráter derivado do seu poder. Mas que absurdo adorar a um poder derivado! O homem sempre “se prostra” diante de algo – ou diante da fonte do poder, ou diante de um poder derivado. O Diabo não explica “quem” lhe deu este poder; se explicasse, a tentação cairia no ridículo. No discurso do Diabo há sempre um ponto além do qual ele não quer que a lógica seja levada. A resposta do cristão é de ser mais lógico que o Diabo, penetrando as suas mistificações.

O Diabo oferece poder e glória, um cardápio atraente! Poder: a capacidade de desenvolver meus projetos, realizar minhas ambições. O cristão tem a promessa do reino de Deus, quando vier na sua plenitude, como esfera para o exercício de dons e responsabilidades; porém, a tentação aqui é a de antecipar-se. Glória: o reconhecimento que almejo, em parte para me gabar e em parte para justificar a minha existência perante Deus e as pessoas. O caminho da cruz inclui a crucificação do desejo de ser reconhecido e respeitado.

E o Diabo oferece tudo isso em troca de quê? Apenas de um gesto de adoração privada. Isso mostra a importância da adoração na agenda do Diabo e lança luz sobre a proibição taxativa na Bíblia de qualquer forma de espiritismo ou ocultismo. A adoração a Deus não pode ser combinada com outras adorações. Tem de ser singela. Afinal, o Diabo oferece tudo a Jesus – e mesmo assim, acha que vai fazer um bom negócio.

A tentação de Jesus é política. O Diabo oferece todos os reinos (o Império Romano?). Em termos concretos, como é que Jesus, o homem no deserto, imaginava que poderia se tornar rei de toda a terra? Qual o mecanismo sociologicamente observável que possibilitaria o cumprimento das palavras do Diabo? Obviamente, para o homem Jesus, tinha de haver uma plausibilidade na tentação, senão, não seria uma tentação real. As mesmas palavras do Diabo para mim não seriam tentação, mas motivo de riso. O fato é que Jesus poderia fazer uma carreira política e justificá-la com as melhores razões. Mas ele renuncia a essa possibilidade concreta, porque significaria o comprometimento com um poder derivado. As boas razões que o Diabo poderia sugerir a Jesus para que aceitasse a sua proposta (o desgoverno, a miséria etc.) não o cegaram para o fato de que há dois tipos de corrupção: a clássica, de usar o poder para se enriquecer ou conseguir outros benefícios; e a mais sutil, a de fazer do próprio poder um ídolo (com as melhores intenções, claro). Um conhecido exemplo é o de Robespierre na Revolução Francesa; era “incorruptível”, no sentido clássico acima, mas se julgava indispensável ao processo, justificando assim o uso de meios duvidosos para se manter. O “indispensável”, o “iluminado”, o “grande líder” (e também todas as “vanguardas”), também são corruptos. Mas Jesus é aquela ave mais rara de todas: um “indispensável” que é convidado a assumir o poder, mas que se indispõe com todos os mediadores e só aceita o poder da mão de Deus.


Nota
1. In: STOLL, David. Is Latin America turning protestant? Berkeley: University of California Press, 1990. p. 58-59, 65.

Texto publicado originalmente no livro Nem Monge, Nem Executivo (Editora Ultimato)

Paul Freston: Autor de "Religião e Política, sim; Igreja e Estado, não" e "Nem Monge, Nem Executivo - Jesus: um modelo de espiritualidade invertida", ambos pela Editora Ultimato; e "Neemias, Um Profissional a Serviço do Reino" e "Quem Perde, Ganha", pela ABU Editora, Paul Freston, inglês naturalizado brasileiro, é doutor em sociologia pela UNICAMP. É professor do programa de pós-graduação em ciências sociais na Universidade Federal de São Carlos e, desde 2003, professor catedrático de sociologia no Calvin College, nos Estados Unidos. É colunista da revista Ultimato.

Fonte: http://www.ultimato.com.br/conteudo/a-tentacao-politica-e-a-etica-da-renuncia

quarta-feira, 9 de julho de 2014

"Atraso!' Uma benção temporária de Deus!


POR JOSEMAR BESSA

Tempos atrás, um instrutor de paraquedismo do exército aqui no Rio de Janeiro, sofreu um acidente num salto de instrução. O paraquedas se embolou com o paraquedas reserva e ele caiu de uma altura enorme  e  apesar da queda quebrou apenas o braço... Sobreviveu de maneira incrível.

Em momentos assim, muitas vozes dizem que Deus “gosta” daquela pessoa em particular – “Alguém lá em cima olha por mim!”

E quando a pessoa tem uma vida longeva, 70, 80, 09, 100 anos. Imagine todos esses anos num mundo cheio de perigos, quantos livramentos aconteceram, quantas vezes se venceu enfermidades, acidentes... desde a infância.

Todo problema está sobre que interpretação o homem dá a isso. Na contagem dos livramentos nós tentamos achar a razão. E em nosso mundo, libertação é interpretada com aprovação. Se Deus não estivesse de alguma forma satisfeito ele teria deixado essa pessoa morrer, não teria dado tantos livramentos, não daria uma vida tão longa...

Olhando para a natureza da paciência de Cristo, longanimidade e tolerância para com os pecadores, qual é o veredicto da Bíblia? Ela mostra que o pecador erra ao tentar interpretar a paciência de Deus. Não havendo punição imediata sobre o pecado, dando continuidade a misericórdias temporais, o pecador faz a leitura oposta a que devia fazer: “Ou desprezas tu as riquezas da sua benignidade, e paciência e longanimidade, ignorando que a benignidade de Deus te leva ao arrependimento?” Romanos 2:4

Devemos lembrar que a demora de Deus não é uma fraqueza moral. Não é uma visão tolerante para a vida do homem em pecado. Muitos põe sua fé, não na revelação bíblica de Deus, mas num aspecto que mais lhe agrade. Pensão então que porque Deus não puniu o pecado de uma vez só, nunca irá chamar o homem para a prestação de contas. Então ele morre cheio de fé, não no evangelho, mas na paciência de Deus.

Ao olhar a paciência de Deus experimentada em toda sua vida, o homem interpreta isso como sinal do favor divino, e ele morre assumindo que essa tolerância vai durar para sempre. Mas a tolerância não é aprovação. A tolerância divina não é absolvição, a tolerância divina não é o cancelamento da dívida. Esse tempo é apenas um atraso temporário do julgamento. Esse atraso está cheio de paciência, misericórdia, generosidade...

“Ou desprezas tu as riquezas da sua benignidade, e paciência e longanimidade, ignorando que a benignidade de Deus te leva ao arrependimento? Mas, segundo a tua dureza e teu coração impenitente,entesouras ira para ti no dia da ira e da manifestação do juízo de Deus” -Romanos 2:4-5

O atraso não é aprovação, ira vai sendo represada a medida que os anos vão passando. E nós sabemos que algo represado quando finalmente e liberado a destruição provocada é muito mais trágica.

Ajudemos aos outros a interpretar corretamente as misericórdias temporais de Deus e jamais olhemos as misericórdias de Deus como aprovação a tudo que Ele despreza, em nós ou no mundo.


“Buscai ao SENHOR enquanto se pode achar, invocai-o enquanto está perto”.Isaías 55:5

terça-feira, 1 de julho de 2014

Renovando os votos

Por Leonel Elizeu Valer Dos Santos

“Bem-aventurado o homem que acha sabedoria, e o homem que adquire conhecimento;… É árvore de vida para os que dela tomam, e são bem-aventurados todos os que a retêm.” Prov 3; 13 e 18

Alguns verbos chamam atenção na relação proposta ao homem com a sabedoria; acha, adquire, toma, retém. Claro que “achar” não deriva de ser, Sophia, uma errante, antes, mesmo estando clamando nas ruas como versa o mesmo sábio, poucos a identificam. Acontece que o mundo que derivou da árvore da ciência, não raro, se opõe aos reclames da Árvore da vida.

Por ser a vida espiritual, abstrata, não pode ser achada no âmbito natural onde de exercita a ciência. Então, às vezes os postulados daquela parecem chocar-se com os conselhos desta. Basta ver a definição da origem das espécies oferecida pela “ciência” nas universidades, por exemplo.

Sabedor de tais contradições Paulo apresenta o retorno à Árvore da Vida, Cristo, como um choque na sensatez que assessora a ciência. “Porque a palavra da cruz é loucura para os que perecem; mas para nós, que somos salvos, é o poder de Deus… Mas nós pregamos a Cristo crucificado, que é escândalo para os judeus, e loucura para os gregos.” I Cor 1; 18 e 23 Assim, achar a sabedoria pode equivaler a perder o juízo, enlouquecer, para os padrões naturais.

Entretanto, após achar precisamos adquirir a mesma. Alguns entendem mal a graça de Deus como se significasse que Ele faz tudo e a nós resta apenas receber. Não. Graça significa apenas que nenhum de nós merece o que Ele fez. O fez soberanamente por causa de seu amor a despeito de nossos deméritos. A sujeição de nossa vontade enferma à doutrina de Cristo, a cruz, é o preço que toca a cada um que, achando, deseje adquirir a sua porção da Sabedoria de Deus. “Porque, se fomos plantados juntamente com ele na semelhança da sua morte, também o seremos na da sua ressurreição; sabendo isto, que o nosso homem velho foi com ele crucificado, para que o corpo do pecado seja desfeito, para que não sirvamos mais ao pecado.” Rom 6; 5 e 6

A ideia expressa é inequívoca; deixar de servir ao pecado para abraçar a Vontade de Deus. Mudança tão radical que equivale a morrer. Acha, identifica; adquire, paga o devido preço. Toma… no domínio material é possível adquirir algo e o não tomar para si, fazer-se proprietário sem levar consigo. Porém, a aquisição da salvação, veículo da Sabedoria e amor Divinos, ter e não tomar para si só pode engendrar a hipocrisia. Não é um produto que se possa comprar para terceiros; respeita à vida; à nossa.

Pela mesma razão, não pode ser usufruído apenas em ambientes favoráveis e ocultado em outros. Nossa posse da vida eterna deve ser amplamente visível; “Vós sois a luz do mundo; não se pode esconder uma cidade edificada sobre um monte;” Mat 5; 14 Embora, eventualmente, seja prudente não alardearmos nossa fé em circunstâncias que geraria discórdia, violência, não existem agentes secretos no reino de Deus.

Então, a ideia é identificar, adquirir e levar consigo por onde for, esse precioso bem. Mais ou menos como andar de bicicleta que se parar de pedalar pode cair, parar de andar segundo o que aprendemos a crer equivale à queda espiritual; Paulo exorta: “Aquele, pois, que cuida estar em pé, olhe não caia.” I Cor 10; 12

Acontece que tomar dessa preciosidade pode ser sazonal, uma decisão emotiva enquanto as coisas “derem certo”, mas, faltar ousadia confiante no dias difíceis; aí chegamos ao quarto verbo, reter.

O Salvador ilustrou os crentes sazonais, emotivos, como sementes inúteis que caíram sobre pedras; “O que foi semeado em pedregais é o que ouve a palavra e logo a recebe com alegria; mas não tem raiz em si mesmo, antes é de pouca duração; e, chegada a angústia e a perseguição, por causa da palavra, logo se ofende;” Mat 13; 20 e 21

Embora possa ser simplificado como perseverança, reter encerra a ideia de ter de novo, adquirir outra vez. Acontece que a posse de tal preciosidade não é pacífica, antes, objeto de disputa, de oposição. Perseguição por causa da Palavra é a “pedra” que ameaça a semente da fé.

De certo modo, pois, precisamos “renovar nossos votos” todos os dias. E fazemos isso cada vez que dizemos não às tentações que nos assolam. Essas buscam voltar nosso olhar para as circunstâncias, os prazeres agora, o fruto da ciência; a fé espera nos prazeres vindouros, pois, comendo da Árvore da Vida tem vida eterna, os prazeres podem esperar.

A “ciência” tem sua glória em cem metros rasos; a fé triunfa na maratona da eternidade.