sábado, 16 de maio de 2015

O amor, uma figura e nada mais?

Por Robson Santos Sarmento


O amor, uma figura e nada mais?


Se folhearmos as páginas da história da humanidade, com toda uma abundancia de episódios de violência em face de raças, povos, comunidades, nações e, enfim, seres humanos, há ainda condição de creditar e acreditar no amor?

Aliás, essa palavra acaba por trazer toda uma conotação ambígua, ambivalente e até conflituosa. As vezes, traz uma sensação de ser uma figura e nada mais, sem nenhuma aplicabilidade na realidade concreta, com suas vicissitudes, com suas oposições, com suas tensões, com suas perdas, com suas indagações. Mesmo assim, vira e mexe, debruçamo – nos a ponderar sobre o mesmo.

De certo, os denominados cristãos carregam em si o amor como uma máxima, uma norma capital a ser seguida e praticada. Agora, mesmo diante de todo um arsenal de discursos referente ao amor, verdadeiramente, o vivenciamos, a partir dos ensinamentos efetivos de Jesus?

Afinal de contas, o amor apregoado pelo Carpinteiro da vida traz a tona as feridas, sem submeter o atingido a uma espécie de martírio, como os legalistas faziam e fazem, ao qual mais servem para enredar a pessoa num emaranhado de culpa e condenação.

Quem pecou, a lei deve ser cumprida, não é merecedor e outras sentenças de uma espiritualidade mesquinha e hipócrita. Em meio a todas as interpretações impiedosas das alas dos fariseus, dos intitulados arautos da tora, Jesus entra em cena, quebra os protocolos da vida restrita a uns, derruba os cercados do sábado e abre passagem para as boas novas (curar também passava a ser possível, aos sábados), estende as mãos para as mulheres, as ouve, as levanta, as trata com os ventos suaves e as lágrimas dóceis da esperança, da fé de recomeços.

Não para por ai, ouve, ouve e ouve, antes de falar, os samaritanos, o centurião romano, a mulher síria – fenícia e joga as redes da intensidade, da proximidade e profundidade, pelo qual todos e tudo encontram sua restauração e reconciliação, ou seja, o sentido de ser e existir. Eis o aspecto de inquestionável peculiaridade do amor encarnado na revelação do Cristo Ressurrecto; em outras palavras, o amor voltado a apontar para a vida em parceria, compartilhada e em participação. Sem sombra de dúvida, o amor personificado na Graça não nos torna compromissados com uma visão egoísta, individualista, manipuladora, mas sim abre oportunidades para os acertos, para os ajustes, para as pontes de diálogo e serviço. Cada vez mais, chego a conclusão de que os feitos extraordinários tão propagados por lideranças carismáticas, somente, mantém as pessoas e não as direciona ao discipulado, a confissão, a uma espiritualidade criativa, revolucionária, que assume os riscos do não e das perdas, em prol de mudanças fundamentais nas inter – relações humanas. Deveras, todos os domingos (e aqui abro um parêntese para os evangélicos e me incluo) escutamos temas sobre o amor, como o amor permanece, ouve e conhece e deveríamos abrir os olhos para perguntar:

- Eu acredito nisso?

Vou adiante, o amor ecoado por Jesus não instituiu nenhuma bandeira, não fez muros de divisão entre povos, não desumanizou o próximo (por ser negro, por ser não ser cristão, por ser ateu, por isso, aquilo e acolá), não removeu do ser humano a arte, a poesia, o romance, a pintura, a escultura, não incitou nenhuma inquisição aos pensadores da ética, da ciência, aos homens e mulheres que nem sequer tiveram contato com Cruz do Ressurrecto, não fez vistas grossas para o tatuado, a garota de programa, a mãe solteira, o homossexual, o favelado, não elevou a pobreza como passaporte para a eternidade e muito menos a riqueza como prova da divindade, não se vestiu com as roupagens da teologia e suas elucubrações, não deixou de estar com os boêmios, com os tido como anarquistas e desafiadores do sistema pré – estabelecido, não usou as catástrofes para acusar ou condenar, não se colocou como um fornecedor de respostas para todas as questões da vida. Então, que amor é esse?

E esse amor despido de rótulos, de ufanias, de triunfalismos tolos!
Eita amor arredio, diante das tentativas de o engessar, de o amordaçar, de o tiranizar com idealismos e, em direção oposta, abraça, ouve, estende, recomeça, transforma, liberta e aceita ser chamado de inocente, de desperdício, de incompreensível. Por ora, talvez precisamos, com urgência, desse amor chamado Cristo Jesus para desmoronar com todos os labirintos que tem afligido e assolado as pessoas.


Fonte: http://www.ultimato.com.br/comunidade-conteudo/o-amor-uma-figura-e-nada-mais

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