Por Robson Santos Sarmento
"Falamos de uma fé que somente serve para uma intervenção nos extremos e em direção oposta o evangelho nos chama para a fé que nos leva a arriscar pela vida e riscar toda e qualquer visão que não tenha o próximo como parte fundamental de nossa existência, de nossa espiritualidade e nossa humanidade.’’
A multidão estava possuída por uma sede virulenta de justiça, a partir das próprias mãos. Os gritos de defesa em favor de uma cartilha mosaico moralista ou a cólera de muitos, ao qual nem sequer conseguiam discernir o por qual motivo tudo aquilo. Mas isso não importava, cada um parecia munido de uma ética para canalizar todas suas agruras e indignações. Ali!
Afinal de contas, ir ou assumir uma linha partidária em face da opressão romana ou das alas abastadas seria um desperdício ou nadar para morrer na praia. Sinceramente, alguns homens traziam uma mulher aterrorizada pelo cerco de uma revolta, como se tivesse manchado a honra de toda uma nação, de seu deus, de sua história, de sua dignidade, de sua identidade e sei la mais o que.
Por alguns longos minutos, tratada como uma figura bizarra, como algo enviado pelo mal e, por isso, deveria ser punida a pedradas inexoráveis, a ser feito por cada homem de bem. Eis, então, a mulher jogada violentamente aos pés do Messias das ruas, do Carpinteiro do recomeçar, do espelho de uma espiritualidade não pré – fabricada, alforriada dos protetorados teocráticos, livre das amarras teológicas desprovidas do sangue da inovação e criação, em suas veias.
Grosso modo, o contraponto de um Messias irreverente, hilário, com palavras ácidas e afiadas para desmoronar as muralhas de idealismos escusos e prolixos. Enfim, um salvador aberto e franco para os acertos, para os ajustes, para a justiça inclinada a restaurar e reconciliar, para a esperança envolvida com atos e práticas de bondade e beleza, em meio ao barulho da superficialidade de todas os dias e o mórbido silêncio dos olhares, ao término de mais um dia. Sem nada dizer, as indagações contagiadas por um cinismo extremo e traiçoeiro tinham o foco de colocá-Lo numa situação constrangedora, entre a cruz e a espada, na berlinda, num beco sem saída e agora.
Todos na espreita, no aguardo de uma resposta para eventuais e ferozes ataques. Mesmo assim, a frase dita ressoou por todos os poros daquelas almas:
- Mulher, nem Eu tampouco te condeno, vá e não peques mais!
Os passos de retirada e as pedras deixadas pelo caminho demonstraram uma ruptura nas pretensas posturas de verdades sólidas e princípios imutáveis. De certo, todos pareciam estar na eminência de lincharem sua humanidade. O espetáculo havia terminado, o olhar sincero e sereno da Graça a animou a se levantar, a voltar a se perceber como ser humano, como gente e como pessoa, a não apagar as decisões e, mesmo assim, não fazer disso uma inquisição a ser carregada.
Aproveito esse ruminar, a partir do episódio da mulher adultera e elucubrar sobre os acontecimentos de linchamento de um jovem, no Maranhão e em demais lugares. Evidentemente, será o antídoto correto para saciar o vácuo no qual as populações desafortunadas de respeito estão?
É bem verdade, adentramos numa espiral de justificativas e ponderações sobre correspondentes procedimentos de barbárie e profunda puerilidade da vida, ao qual passa a não valer nada. Ouso, guardadas suas peculiaridades, a traçar um paralelo com o episódio do genocídio cometido pelos filhos de Jacó, em decorrência de sua irmã, Diná, ter sido violentada e outros retratados pela bíblia.
Vale notar, os linchamento são uma prática corrente na história da humanidade e vira e mexe nos deparamos com os mesmos. Cabe salientar, como tenho efetuado essa leitura, pelo qual, lá no fundo, chegamos a conclusão de não conseguir estabelecer uma resposta efetiva?
Deveras, a pena de morte, o linchamento e outras atrocidades não resolveram e muito menos resolverão problemas engendrados e concebidos, em parte, pela omissão das autoridades, conforme Jeremias 22.03 especifica. Vou adiante, qual tem sido a nossa fé, em meio ao linchamento, declínio da vida, aos abismos sociais e humanos, as crises a torto e a direita?
Não venho aqui querer ser Jesus e tratar questões tão nevrálgicas e viscerais com uma despedida e o transgressor virar as costas e pronto; entretanto, os cânones normativos legais não podem diluir situações que, lá no fundo, são o desfecho de toda uma complexidade de fatores (sociais, psicológicos, culturais e espirituais). Ademais, devemos evitar daqui a pouco, não começamos a aceitar, além dos linchamentos, a crucificação, como uma forma de punição, de satisfação momentânea de coletividades sem saber a quem recorrer, a quem crer e confiar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário